Grifes de olho nas fofinhas
Marcas de luxo, como Marc Jacobs, Chanel e Valentino, preparam coleções que vão até o número 52, e miram um mercado de US$ 27 bilhões
Por Natália Mestre
Quanta inveja (raiva?) as mulheres normais já não passaram ao assistir aos glamourosos desfiles de moda de Paris e Nova York e perceber que jamais entrarão num daqueles modelitos maravilhosos apresentados pelos estilistas badalados?
Pois esses dias de tortura e tormento fashion estão com os dias contados. Pelo menos para as fãs de Marc Jacobs, Chanel, Alexander McQueen, Valentino, Dolce&Gabbana, Fendi e Oscar de la Renta. Todas essas grifes anunciaram, no início do terceiro trimestre, que irão comercializar modelos de suas criações em tamanhos que vão bem além da rigidez fashion – que só permite lugar ao sol para as silhuetas que vão do 34 ao 40 (sendo bem condescendente).
Desfile de manequins acima do peso, da marca City Chic, em evento de moda australiano
O movimento é estratégico comercialmente e mexerá com a imagem institucional dessas marcas. A decisão dessas grifes, ícones do mercado de luxo, indica que a moda premium acordou para um gigante desprezado: um mercado estimado em US$ 27 bilhões em todo o mundo, segundo dados do Global Purchasing Group – a Organização Mundial da Saúde aponta pelo menos 1,6 bilhão de pessoas obesas no mundo, e a projeção é de que 2,3 bilhões de pessoas cheguem a 2015 acima do peso.
Nas araras da loja de departamentos Saks 5Th Avenue, em Nova York, é que essa tendência irá debutar a partir de outubro. As roupas, que antes iam até o G – que equivaleria ao nosso 44 (também sendo bem condescendente) –, vão ser vendidas agora em Extra Grande (que seria o equivalente ao nosso 52).
Robert Duffy, sócio do estilista Marc Jacobs e presidente da marca, anunciou que a grife também terá uma linha de roupas adaptadas para as mulheres de silhueta maior. Há tempos grifes e estilistas vêm sendo pressionados para deixar de usar modelos tão magras nas passarelas, que propagam o padrão estético anoréxico como algo normal e uma meta a ser atingida.
Na Semana de Moda de Paris, em março, Marc Jacobs já criou para a Louis Vuitton modelos retrôs, com saias e vestidos de cintura bem marcada, porém volumosos. Um alívio para os corpos mais curvilíneos, que, embaixo de todo o volume, podem acolher a normalidade de seus manequins mais cheinhos sem constrangimento.
Na mesma onda, revistas conceituadas de moda, como a edição francesa da “Elle” e a “V Magazine”, estamparam editoriais dedicados ao guarda-roupa plus size – termo utilizado para definir as pessoas que vestem tamanhos muito grandes de roupas. Já existe um pequeno batalhão de beldades mais voluptuosas à disposição dos estilistas e dos produtores de moda, nas agências de modelos.
Curvas fashion: ensaio fotográfico com modelos fora do padrão tradicional revela uma tendência:
a aposta das marcas de luxo numa população que já soma 1,6 bilhão de consumidores
Duas das mais requisitadas são a americana Crystal Renn, a plus size que já fotografou para Jean Paul Gaultier, e a brasileira Flúvia Lacerda. E até mesmo semanas de moda dedicadas somente à modelagem mais avantajada já estão acontecendo, como a Full Figured Fashion Week, em Nova York.
Na semana passada, foi anunciado que a badalada Semana de Moda de Nova York terá pelo menos um desfile de roupas plus size. “A sociedade deseja que a moda seja mais democrática e o luxo não poderia ficar de fora dessa corrente”, avalia Selma Felerico, coordenadora da pós-graduação em comunicação da ESPM, em São Paulo.
“As grifes estão se abrindo para um grupo com grande potencial econômico, mas que não se encaixava no mercado”, explica Ellen Kiss, coordenadora do curso avançado de marketing para produtos e serviços de luxo da ESPM, em São Paulo.
Luxo peso-pesado: acima, a atriz "plus size" Dirty Martini posa para a renomada lente
do estilista Karl Lagerfeld, da Chanel, em ensaio pela "V Magazine"
Além disso, levantar a bandeira da moda democrática, assim como algumas marcas utilizam a bandeira ecológica, costuma ser uma ação positiva para a imagem da grife. “As pessoas adquirem simpatia pela marca.Como aconteceu com a campanha pela real beleza da Dove, com mulheres de diferentes biotipos”, diz Ellen.
No entanto, existem especialistas que alertam para os dogmas do luxo, que ressaltam o conceito da exclusividade. “Entendo que não faz sentido as marcas deixarem os consumidores que estão acima do peso de fora do negócio.
Mas acredito que o verdadeiro luxo é fazer roupas sob medida. Dessa forma, atende-se esse cliente (acima do peso), mas se mantém o conceito da exclusividade”, contrapõe Silvio Passarelli, diretor do programa do MBA Gestão de Luxo da Faap, em São Paulo. Passarelli destaca que o grande desafio agora será expandir, abrigando esse novo e polpudo mercado, mas conservando o DNA da marca.
Fonte: http://www.istoedinheiro.com.br/noticias/31559_GRIFES+DE+OLHO+NAS+FOFINHAS